O 27 DE MARÇO DE 2018 já estava quase acabando quando o site do TSE publicou que o próprio presidente da casa havia instaurado “procedimento para averiguar uso de notícias falsas na internet“. No subtítulo, complementava que a iniciativa tinha “por base dois estudos acadêmicos que apontam uso de robôs e sites especializados na divulgação de fake news com conteúdo eleitoreiro“. O Web Archive conseguiu capturar a versão original deste texto, que teve o subtítulo alterado na tarde do dia 29 de março para: “iniciativa tem por base dados que apontam uso de robôs e sites especializados na divulgação de fake news com conteúdo eleitoreiro”.
Por um motivo simples: um dos “estudos acadêmicos” era, por ironia do destino, falso.
Sim, falso.
O desmentido não reverberou tanto e surgiu em coluna da Folha de S.Paulo sem tanta objetividade no título: “Até autoridades que fiscalizam difusão de fake news estão sujeitas a serem enganadas“. Os autores do suposto estudo se disseram surpresos e acharam por bem esclarecer:
“Na condição dos pesquisadores responsáveis por essa suposta pesquisa da USP, gostaríamos de aproveitar a oportunidade para esclarecer que esse tão difundido estudo não passa de um grande mal-entendido que rapidamente se tornou uma espécie de ‘notícia falsa sobre notícias falsas’. Não existe um ranking dos maiores sites de notícias falsas feito pela USP ou com base em estudo da USP.”
Mais adiante, reforçaram:
“O levantamento não é baseado em estudo da USP, não é sobre notícias falsas, mas sobre sites que buscam esconder quem são os responsáveis e não diz que esses sites são os maiores, em qualquer sentido da palavra“
A coluna ainda aponta algo que reforça o argumento da direita, o de que a esquerda usa o suposto combate a notícias falsas para ludibriar os leitores prejudicando discursos conservadores e liberais:
“O principal ponto é notar que o levantamento original (depois modificado pela associação) listava apenas sites de direita e a matéria equivocada que o repercutiu concluía que o principal difusor de notícias falsas era o MBL“
Os autores tentaram notificar do equívoco o máximo de canais possível. Mas a coisa atingiu uma proporção incontornável. O que os levaram à conclusão:
“as pessoas de esquerda já estão tão convictas de que a direita é desonesta que uma matéria completamente distorcida e falsa pode irrefletidamente ser tratada como se fosse verdadeira e passada adiante na dinâmica de combate das mídias sociais. Se o conteúdo do suposto ranking fosse misto com sites de esquerda e de direita, jamais teria tido o alcance que teve.
Alguns dos projetos listados simplesmente faliram após a disseminação do boato. O que delineia e justifica toda a preocupação com o alegado combate a notícias falsas. Em mãos erradas ou mesmo maliciosas, é capaz de funcionar como censura a qualquer divergência. E o próprio Estado, como no exemplo aqui citado, mostrou-se capaz de injustiça tão danosa.
Por isso, todo o cuidado é pouco. Na dúvida da veracidade, não compartilhe – uma dica valiosa até para o TSE.