A AGÊNCIA já havia constatado que o Ministério Público teve acesso ao relatório do COAF muito antes da eleição de 2018. A Folha de S.Paulo foi além, confirmando a data exata – 03 de janeiro daquele ano – e um estranho hiato entre 06 de agosto e 22 de novembro, quando Fabrício Queiroz foi finalmente convidado a prestar depoimento.
Em verdade, os trabalhos foram retomados um tanto antes, ao menos em 17 de outubro, exatamente dois dias após Flávio Bolsonaro exonerar o assessor problemático, e Jair Bolsonaro estranhamente fazer o mesmo com Nathalia Queiroz, filha de Fabrício – a Operação Furna da Onça só seria deflagrada em 8 de novembro, mas o investigadores concluiriam que o trabalho vazara aos investigados.
Em reposta a reportagem do Jornal Nacional, o Ministério Público reconheceu a boa vontade com o clã Bolsonaro. E assumiu ter tomado cuidado para que o material colhido não se tornasse público antes do fim da eleição de 2018. E mais: que voltou o foco a peixes maiores.
O MP esclareceu ainda que tomou cuidado para que nada fosse divulgado antes do processo eleitoral, para que nenhum parlamentar fosse prejudicado. E que deu prioridade a fatos investigados de acordo com a hierarquia das autoridades políticas e servidores.
Relatório do Coaf mostra que Flávio Bolsonaro pagou título de R$ 1 milhão
Ainda que em praças distintas, o trabalho do Ministério Público fez bastante barulho na campanha de 2018. O do Paraná, por exemplo, prendeu Beto Richa. O de São Paulo foi para cima de Geraldo Alckmin e Fernando Haddad, dois adversários diretos do atual presidente da República. Uma pesquisa no Google Trends confirma que o período em que a instituição mais despertou interesse foi justamente o eleitoral.
Mesmo que não tenha sido obra direta do MPF, mas da Polícia Federal, cabe lembrar que a delação premiada de Antonio Palocci perdeu o sigilo na reta final do primeiro turno. E o autor da liberação, dias após a confirmação da vitória, foi convidado a atuar como ministro da Justiça do Governo Bolsonaro.
Sergio Moro tinha a obrigação moral de agir com imparcialidade, mas sempre foi entendido como um aliado da operação Lava Jato. Ou seja, da força-tarefa composta também por integrantes do Ministério Público. Por isso, os movimentos no segundo semestre de 2018 colocaram em suspeição não só o trabalho do juiz federal, mas o de toda a Justiça, que passara os anos anteriores sob acusação de “ativismo judicial” ao tentar livrar o País da corrupção.
No ar, restou a sensação de que os investigados foram escolhidos por critérios políticos. E que, não por coincidência, o sucesso caiu justo no colo de quem foi poupado – mesmo com estes mantendo relação tão atípica com o crime organizado.