O GOVERNO ROMEU ZEMA mentiu – comprovadamente – sobre a existência de um ‘parecer’ para liberar a entrevista de Guilherme Boulos neste mês ao Roda Viva.
A informação foi obtida por A Agência por meio da Lei de Acesso à Informação.
Boulos foi entrevistado pelo Roda Viva em 3 de outubro, um dia depois do 1º turno. Naquele momento, não era mais candidato. Já tinha sido eleito o deputado federal mais votado por São Paulo, com mais de 1 milhão de votos.
A Rede Minas, parceira da TV Cultura, não exibiu a entrevista. No lugar, levou ao ar entrevista da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, originalmente exibida em junho de 2021 (já chego ao porquê da escolha).
Questionada a respeito no começo do mês, a Rede Minas respondeu à imprensa que “Após parecer favorável, o programa será exibido nesta quinta-feira [6 de outubro], às 22h”.
A Agência pediu à secretaria de Cultura e Turismo o tal “parececer”. A resposta veio nesta segunda (24).
“Atendendo a (sic) sua solicitação informamos que, em razão de necessidade de celeridade em relação a análise dessa demanda, foi feita uma consulta oral à assessoria jurídica da Secult-MG, e seguido orientação baseada na legislação vigente”.
Portanto, o governo de Minas está admitindo que não houve “parecer” algum.
Uma busca por “parecer jurídico” no Google confirma que o termo é usado em Direito para se referir a documentos escritos.
Tramita na Câmara, por exemplo, projeto para eximir advogados de responsabilidade sobre pareceres – chamados de “peças opinativas”.
Texto do blog do IDP diz que o parecer “só pode ser assinado e desenvolvido, exclusivamente, por advogados”. Não se “assina” consultas orais.
O escritório Nobre Advogados informa que “O parecer jurídico é um documento“.
Cadê o “parecer” do governo Zema? Não existe. É intangível.
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Por que o governo Zema decidiu exibir no lugar de Boulos a entrevista de Chimamanda Ngozi Adichie, originalmente transmitida há mais de um ano?
Não há “parecer” para confirmar, mas tenho uma hipótese.
Ao responder a uma pergunta sobre as religiões de matriz africana, Chimamanda respondeu que o cristianismo pentescostal é “esmagador” na África. Ela acrescentou ter sido criada na fé católica, e que não há muita consciência das religiões tradicionais entre os jovens nigerianos. E disse: “O que me interessa cada vez mais é como africanizar o cristianismo”.
A educada resposta de Chimamanda, que destacou inclusive o trabalho de pastores evangélicos em demonizar as religiões tradicionais, fez muitos bolsonaristas se contorcerem de prazer, por destacar que os orixás não são tão populares na África. Volta e meio o trecho viraliza de novo no Twitter pelas mãos da turma que vive reclamando de “cristofobia”.