Opinião

É preciso deixar claro: a birra com o Mais Médicos findará em mortes

É, sim, lamentável que verba pública sirva ao financiamento de ditaduras. E há como crer que a situação foi deliberadamente arquitetada pelo governo Dilma. Mas nem os Estados Unidos conseguem viver sem um bom relacionamento com ditadores. Logo, não é razoável acreditar que o Brasil poderia se dar a tamanho luxo.

A direita é contra a lei que enxerga “trabalho análogo à escravidão” em tão amplo campo de atuação. Tanto que, em vão, atuou em 2018 para flexibilizá-la. Pois vê no texto um instrumento político explorado pela esquerda para dificultar a participação de grandes nomes do Mercado na política.

Logo, se a direita agora reclama que os cubanos são vítimas de trabalho escravo, assim se manifesta por puro cinismo: para fazer com que a esquerda prove do próprio veneno.

De certa forma, a postura é “do jogo”. Mas colocar em risco a saúde de 28 milhões dos brasileiros mais carentes não é.

Goste-se ou não, o trabalho dos médicos cubanos no país é – ou era – necessário, ainda que a presença de Cuba mereça repúdio. O governo Temer vinha tratando o problema com a cautela exigida: em 2 anos, substituiu mais de 3 mil cubanos no programa. Em paralelo, novas escolas de medicina foram criadas, e esforços foram feitos para haver uma boa relação do Brasil com a ditadura castrista. Nesse ritmo, o conflito seria pacificado em 2024.

Bolsonaro manteve postura tão intransigente pela birra ideológica que lhe é característica. E é preciso deixar claro que tamanha irresponsabilidade resultará em mortes. E mortes dos brasileiros das camadas mais frágeis, ou aquelas que o Estado mais deveria proteger.

Quantas mortes? Será difícil mensurar, pois o poder para fazer conta tão complexa estará justo no colo de quem fez a lambança.

Deliberadamente ignorando que Bolsonaro celebra o 31 de março anualmente, há quem recrimine a crítica aqui detalhada como apoio a uma ditadura. Pior, contudo, tem sido a vista grossa reservada à tragédia que se avizinha.

E essas vítimas mais carentes morrerão para quê? Para que brasileiros que não precisam da saúde pública possam celebrar nas redes sociais uma alegada superioridade moral.

Por fim, vale destacar que o próprio movimento de Cuba é estranho. O Mais Médicos rende muita grana ao país. O cavalo de pau não pareceu natural. Soou coisa de quem tem medo do que pode ser descoberto com a troca de comando.

Todavia, se algo do tipo realmente estiver em jogo, o governo Bolsonaro será o mais interessado em rasgar para o mundo.

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Publicado por
Marlos Ápyus