O VEREADOR CARLOS BOLSONARO (PSC-RJ), uma espécie de Cyrano de Bergerac do Presidente, parece estar com a consciência pesada.
Nesta quarta-feira (13), recorreu ao Twitter várias vezes para negar que seu pai tenha conversado ao telefone com o ministro Gustavo Bebianno, secretário-geral da Presidência, sobre “o assunto citado pelo [O] Globo” ou “o assunto exposto pelo O Globo“.
O vereador não quer dizer, mas todos entendem do que ele fala: de reportagens recentes da Folha, repercutidas por toda a imprensa, que revelaram um laranjal no PSL. Em 4 de fevereiro, o jornal mostrou que o atual ministro do Turismo, o mineiro Marcelo Álvaro Antônio, repassou R$ 279 mil a quatro candidatas em 2018, quando presidia o partido no Estado. Juntas, elas receberam pouco mais de 2 000 votos. Segundo o texto, “ao menos R$ 85 mil foram parar oficialmente na conta de quatro empresas que são de assessores, parentes ou sócios de assessores do hoje ministro de Bolsonaro”.
Situação semelhante ocorreu em Pernambuco. Lá, uma candidata recebeu do PSL R$ 400 mil de dinheiro público na eleição, mais do que o próprio Jair Messias. Teve 274 votos. O endereço da “gráfica” onde supostamente foi gasta parte do dinheiro não tem máquinas, como a Folha revelou na madrugada de terça (12).
Durante a eleição de 2018, Bebianno era presidente interino do PSL e altamente influente. Foi dele a decisão de adiar a Cúpula Conservadora das Américas, conforme o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) publicou em julho. O evento só foi realizado em dezembro, depois do 2º turno.
Pois bem. O que O Globo realmente disse? Nada preocupante para Carlos Bolsonaro:
BRASÍLIA – Após um dia de rumores no Palácio do Planalto de que protagonizava uma nova crise do governo de Jair Bolsonaro, o ministro Gustavo Bebianno, da Secretaria-Geral da Presidência, negou, na noite desta terça-feira, que seja motivo de instabilidade no executivo. Bebianno cancelou agenda programada para esta tarde, depois de almoçar com seus assessores no restaurante do Planalto e ter se recusado a dar declarações à imprensa. À noite, ele se reuniu com o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
— Não existe crise nenhuma. Só hoje falei três vezes com o presidente — disse Bebianno ao GLOBO, afirmando que a conversa se deu por mensagens no WhatsApp. Um dos temas da conversa teria sido o cancelamento de sua viagem ao oeste do Pará, que ocorreria nesta quarta-feira. Segundo ministro, a agenda foi suspensa a pedido de Bolsonaro que esperar ter alta e quer reencontrar seus ministros na volta a Brasília, após 16 dias internado no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Além dele, também cancelaram a viagem o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e a ministra Damares Alves, da pasta Família, Mulher e Direitos Humanos.
— O presidente espera ter alta e nos pediu para esperá-lo aqui para despachar — justificou.
No fim de semana, uma reportagem publicada pela “Folha de S.Paulo” apontou que o PSL, partido do presidente (…)”.
Observem que em nenhum momento o texto disse explicitamente que Bebianno tratou das denúncias na Folha com o Presidente. Ao contrário, ele diz “não existe crise nenhuma” e que falou “três vezes” com ele, ou seja, sem dúvida falaram sobre vários assuntos. Um dos temas da conversa foi o cancelamento da viagem de ministros – e só.
Diante de um texto que, analisado com rigor e calma, é inócuo, eis o que fez Carlos Bolsonaro:
1. Escreveu “Ontem estive 24h do dia ao lado do meu pai e afirmo: “É uma mentira absoluta de Gustavo Bebbiano que ontem teria falado 3 vezes com Jair Bolsonaro para tratar do assunto citado pelo Globo e retransmitido pelo Antagonista.” Mas o jornal nunca disse que Bebianno falou 3 vezes sobre o mesmo assunto!
2. Não satisfeito, voltou ao tema e publicou um áudio com a voz do próprio pai: “Ô Gustavo, tá complicado eu conversar ainda, então não vou falar, não vou falar com ninguém, a não ser o estritamente essencial (…)”. O áudio em si não prova nada, já que não é possível ouvir a voz de Bebianno – ou, se for um “áudio de Zap”, para quem o arquivo foi enviado.
Duas notas: 1) Em O Globo está claro que “a conversa se deu por mensagens no WhatsApp”. Bebianno não disse ter falado literalmente com o Presidente; 2) Bolsonaro teve várias reuniões no hospital, inclusive com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ainda no sábado (9), e certamente falou bastante. Sigamos…
3. Ainda não satisfeito, Carlos publicou esta montagem com duas notícias de O Antagonista, na tentativa de mostrar que se contradizem. Ocorre que elas são de datas diferentes! Uma é de domingo (10) e a outra é desta quarta (13).
Se não é consciência pesada, é no mínimo muita carapuça.