EM QUARENTA DIAS arrastados, a formação do governo Bolsonaro já sofreu várias reviravoltas e baixas. Pastas e responsabilidades são transferidas de um lado para o outro como batata-quente: um exemplo claro é a Funai, que já saiu e voltou para o Ministério da Justiça e permanece em local indefinido.
Se o debate interno sobre a futura administração é normal, algumas rusgas internas ao bolsonarismo chamam mais atenção. Vamos a elas:
1. Carlos Bolsonaro sugere que Mourão quer Bolsonaro morto
Em 28 de novembro, o vereador Carlos Bolsonaro twittou que a morte de Jair Bolsonaro interessa a “inimigos” que “estão muito perto”, “principalmente após sua posse”. A única leitura possível é que um desses “inimigos” é o vice Hamilton Mourão e/ou pessoas que seriam indicadas por ele para fazer parte do governo. Algumas falas de Mourão foram desautorizadas pelo titular durante a campanha. Como sabemos, o general cogitou participar de debates na TV depois que Bolsonaro foi alvo de uma tentativa de homicídio.
O alerta de Carlos é ainda mais grave porque Mourão deve assumir a Presidência por pelo menos duas semanas no começo do governo, assim que o futuro presidente passar por nova cirurgia.
2. Magno Malta dá entrevista lamentando ficar sem cargo
Um dos mais fiéis porta-vozes do bolsonarismo durante a campanha, o senador Magno Malta liderou a oração transmitida ao vivo pela TV na noite da vitória no 2º turno. Ao contrário de todas as expectativas, ficou sem cargo no futuro governo. Malta expressou sua mágoa em entrevista ao Intercept. Fãs de Bolsonaro dizem nos comentários que a explicação é simples: a ele foi oferecido o cargo de vice e ele recusou, preferindo concorrer à reeleição no Senado; terminou com os dois pássaros voando. Em entrevista à Folha, o próprio Jair parece confirmar a tese: “Eu ofereci ser meu vice e ele achou melhor concorrer ao Senado. Não se elegeu. Sou grato a ele”.
Não há qualquer consideração sobre qualificação, propósito ou estratégia.
3. Aliados do bolsonarismo durante a campanha são descartados
Além de Magno Malta, outros cabos eleitorais de Bolsonaro são descartados publicamente. O deputado federal-eleito Julian Lemos, por exemplo, é presidente do PSL na Paraíba e vice-presidente nacional do partido. Apesar disso, Carlos Bolsonaro (de novo ele!) escreveu em 5 de dezembro que “Julian Lemos, a pessoa que tem se colocado como coordenador de Bolsonaro no Nordeste não é e nunca foi!”.
Não é engraçado que Carlos se refira ao vice-presidente nacional de seu partido como “a pessoa que…”?. Mas a revolução tem fome…
4. Um barraco entre integrantes do PSL é revelado
Um barraco entre integrantes do PSL foi revelado nesta quinta-feira (6). Futuros colegas de trabalho, os campeões de voto Eduardo Bolsonaro e Joice Hasselmann trocaram farpas via WhatsApp. No centro da disputa estão a definição de quem o PSL vai apoiar para presidir a Câmara e quem será o líder do partido. Diplomata nato, o senador-eleito Major Olimpio declarou que “não há racha quando são todos contra um”, referindo-se à ex-apresentadora da TVeja. Olimpio ainda acrescentou que foi Joice quem vazou a conversa para a imprensa.
Apesar da declaração de Olimpio, o racha no partido preocupa o presidente-eleito, que deve se reunir na terça (11) com a bancada para uma tentativa de alinhamento.
A luta fratricida entre adeptos do bolsonarismo é comum a várias organizações. O motivo é o mesmo: falta de prioridades. A campanha de Bolsonaro nunca teve um norte que não fossem slogans baratos e a necessidade urgente de mudar “isso daí”. O bolsonarismo pode ser entendido como o que o senador americano Ben Sasse chama de anti-tribo: um coletivo agregado por aquilo que os membros são contra, mas sem planos definidos. E aí qualquer pergunta do tipo “e a Previdência?”, “e as vacinas?”, “e o nosso vice?” causa um racha.