Jair Bolsonaro venceu a eleição presidencial de 2018 ao apostar alto no antipetismo. Foi um dos raros parlamentares a desde o início marcar presença nos protestos pelo impeachment de Dilma Rousseff. E não se furtava a usar palavras chulas ou mesmo gestos agressivos contra integrantes do PT, como quando se permitiu ser fotografado chutando uma caricatura inflável de Lula.
Mas talvez a antítese do petismo não seja assim tão distinta do inimigo que alega combater. Se Fernando Haddad prometia criar condições para elaborar uma nova Constituição para o Brasil, o vice de Bolsonaro prometia uma “Constituição feita por ‘notáveis’“. Se o petista almejava “regular os meios de comunicação“, o que sempre foi compreendido como uma reinstitucionalização da censura, o já presidente da República abraçava estratégias de concorrentes para reduzir o poder da Rede Globo – que, de um lado, vinha sendo atacada, do outro, também.
Se os MAVs do PT usavam as redes sociais para a prática do assassinato de reputações, os milicianos digitais pró-Bolsonaro estão sempre dispostos a participar de linchamentos, ainda que virtuais, de qualquer crítico da agenda do ídolo. Um grupo xingava o jornalismo de PIG (Patido da Imprensa Golpista), o outro, de “extrema-imprensa“.
Sempre ao lado da CUT, o PT chegou ao poder após o apoio incansável a um gigantesco número de greves. Seria favorável, inclusive, à que gerou um prejuízo bilionário ao país em maio de 2018. Trata-se da mesma greve dos caminhoneiros que teve em Bolsonaro um dos principais incentivadores.
Mirando a aceitação do Mercado, Lula neutralizou todo um passado de imprudências escolhendo José Alencar como vice-presidente. Bolsonaro, por sua vez, preferiu terceirizar qualquer assunto econômico a Paulo Guedes, a quem criou um “super ministério” da Economia. Coincidentemente, nem o PT, nem o maior antipetista do país queriam prioridade à reforma da Previdência, tida por economistas como a mais urgente.
Se o Partido dos Trabalhadores não se furtava a emitir seguidas notas de apoio à ditadura venezuelana, Bolsonaro defendia a ditadura militar ao vivo no Jornal Nacional. Se o PT trabalhava toda um discurso oferecendo “narrativas” que distorcem a realidade em benefício próprio, o adversário fazia o mesmo.
Em ambos os casos, o culto a figura do líder já é maior que a fidelidade partidária. Em ambos os casos, a agressividade da militância, quando retrucada, rapidamente se convertia em vitimismo. Em ambos os casos, as alas mais radicais acreditam que só um golpe estatal — que nunca é referenciado nestes termos, mas como “revolução” ou “intervenção” — levará o país a uma “verdadeira democracia” – a ditadura em que eles, e nãos os adversários, ditam.
O petismo se acostumou a tratar como traidor qualquer membro do STF que não votasse em acordo com a agenda partidária. Bolsonaro, por sua vez, cogitou presentear a si mesmo com mais de uma dezena de indicações ao Supremo. Eduardo Bolsonaro chegou a dizer que bastava “um soldado e um cabo” para encerrar os trabalhos na casa.
Conforme destacou o noticiário, o dono da empresa suspeita de impulsionar mensagens de bolsonaristas no Whatsapp havia feito o mesmo por Dilma Rousseff. Se o PT tinha uma rede de “blogs sujos” dando suporte as próprias sandices, o outro lado tinha os perfis “cujos donos não conheço, mas dizem muita verdade que não ficaríamos sabendo se dependêssemos de alguns outros!” Lula chegou a dar entrevista ao que chamava de “blogs progressistas“. O atual presidente da República esquivava-se de embates eleitorais para ser “sabatinado” por apoiadores.
Carlos Lacerda dizia que “não há nada mais próximo de um homem de extrema esquerda do que um homem de extrema direita“. As aspas foram rememoradas por Janaina Paschoal, que ainda era cogitada para a Vice-Presidência pelo PSL. Era um recado claro aos bolsonaristas mais boçais. Todavia, como ensinou o tempo, a lição não chegou a ser compreendida.