Com alguns passos para trás, é possível observar que o Governo Bolsonaro patina sobre uma fina camada de gelo. Que basicamente se resume aos milicianos digitais devotos de Olavo de Carvalho, e à ala Onyx Lorenzoni do DEM – que é bem distinta da ala Rodrigo Maia.
No domingo, Olavo chamou os militares brasileiros de “bando de cagões“. No dia seguinte, Jair Bolsonaro apresentou o escritor como um dos “grandes inspiradores” do próprio comandante-em-chefe das Forças Armadas, cargo que ocupa desde que assumiu a Presidência do Brasil.
O mercado já percebeu que não há de conseguir grandes vitórias com Bolsonaro, tomando um atalho por Rodrigo Maia e Hamilton Mourão, presidente da Câmara e o vice-presidente respectivamente. O STF já se tocou que as ameaças que chegam à própria casa passam pelos milicianos digitais do bolsonarismo. A bancada religiosa já prometeu independência, com Silas Malafaia desautorizando o olavismo a falar em nome dela.
Certamente o presidente da República pode contar com o apoio das forças policiais, mas não pode externá-lo sob pena de se aproximar ainda mais das milícias que mataram Marielle Franco. E uma robusta ala do próprio partido não disfarça que responde ao governador de São Paulo, cotado como presidenciável para 2022.
Desde o início do mandato, o MBL porta-se com alguma independência, mas foi-se o tempo em que conseguia obrar milagres. E apenas a fé ingênua de que será indicado à Suprema Corte sem sofrer um novo ataque dos milicianos digitais faz com que Sergio Moro engula tanto sapo do chefe.
A imprensa é um capítulo à parte. Alvo de constantes ataques, cerca Bolsonaro por quatro flancos: a relação entre Flavio Bolsonaro e milícias, a relação entre Carlos Bolsonaro e linchamentos virtuais, o enriquecimento da família no Vale do Ribeira e as recorrentes quebras de decoro, que podem justificar um processo de impeachment.
A gestão Bolsonaro sustenta-se no desejo da aprovação da reforma da Previdência, algo que nem chegava a ser cogitado pelo PT, mas demanda um controle delicado do jogo político. Contudo, o próprio presidente saliva por turbulência, com a militância mais aguerrida atacando as poucas lideranças que se entregaram a pauta tão complexa.
Não dá para ter esperanças diante deste cenário. Mas constata-se com alguma facilidade que a turbulência nasce do radicalismo dos discípulos de Olavo de Carvalho. Uma limpa na ala revolucionária talvez resultasse numa gestão tão pragmática quanto necessário. O problema: a faxina precisaria levar junto o chefe do executivo, ele próprio seguidor de discurso tão autoritário. Todavia, trata-se de um caminho bem conhecido pelo povo brasileiro.